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quinta-feira, 21 de julho de 2011

Sobre um Fórum de Ideias

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Melancolia, de Edward Munch
Carlos Baqueiro
(cbaqueiro@terra.com.br)

Ontem, no caminho do trabalho para casa, que dá, normalmente, um intervalo de tempo de 40 a 60 minutos (quando não ocorrem alguns engarrafamentos espetaculares podendo aumentar esse tempo em mais uma hora), vim pensando sobre as palavras de algumas das palestrantes do Fórum Mundo do Trabalho, promovido pela Petrobras, lá no prédio da Pituba, aqui em Salvador.

O que fazer a curto prazo para evitar a melancolia ou a ansiedade de uma vida rotineira, automatizada ? Como agir no trabalho ou na vida de uma forma geral para diminuir as tensões criadas diariamente ?

Para elas e outros que falaram sobre temas da psicanálise, da filosofia, da sociologia, uma coisa é certa. Temos que tomar o posicionamento de sujeitos. Aqueles que agem em nome de algo. Seja a liberdade, seja uma vida feliz, seja criando um bom ambiente de trabalho, decidindo sobre nosso futuro.

Baseando-me nas premissas defendidas ali, ao chegar em casa resolvi “não fazer nada”, ou seja diminuir a velocidade/ansiedade dos fazeres. Sempre antes de chegar em casa fico pensando ou em andar 30 minutos na esteira, ou sair até a academia para o Pilates. Ou olhar se alguém deixou recado no Facebook, ou se tenho algum e-mail na caixa de texto. Ou se vou no cinema, ver o novo filme em 3D, ou se reinicio os estudos da Pós-Graduação...

Uma das palestrantes, a psicanalista Maria Rita Kehl deixou claro que devemos reduzir essa agonia de estar fazendo alguma coisa, sempre. E, agindo assim, sendo espelhos para as crianças, esta característica ajudaria a reduzir boa parte dos problemas psíquicos mais comuns dos indivíduos. Essa necessidade (do pegar o mundo com uma só mão) teria origem no desejo de não estar vivendo uma "vida vazia".

Ela me surpreendeu também com uma posição política fortemente anti-capitalista. Afirmou, em resposta a uma questão feita pela platéia, que é possível ao ser humano diminuir essa tensão com relação a "vida vazia" tornando-se um ser que age coletivamente em prol da melhoria do mundo. Em busca da construção de um modelo alternativo de vida.

Essa resposta me fez relembrar da viagem ao Rio de Janeiro e São Paulo em outubro do ano passado, quando aconteciam burburinhos sobre a demissão de Maria Rita Khel do jornal O Estado de São Paulo. Ela havia escrito um ótimo artigo que entre outras coisas falava da Bolsa Família, indiretamente elogiando o governo de Lula, com relação a aquele tema.

Todos sabiam e sabem das preferência do Estadão, mas não se imaginava que a direção do jornal chegasse ao ponto de demitir alguém que admitisse que o governo petista teria feito alguma coisa que prestasse, e de forma tão convincente como foi feito. Mas a eleição estava batendo as portas do país, e Maria Rita Khel foi vítima de suas próprias palavras. O texto saiu no jornal (além de rolar por toda a Internet), e ela foi demitida.

Baseando-me em tudo isso resolvi não fazer nada hoje a noite. Ponto. Obviamente, o não fazer nada no mundo urbano é ficar em frente a TV e assistir as três novelas da Globo (agora são quatro !!). Afff. Bateu ansiedade logo depois da primeira. Cordel Encantado até que é uma boa diversão, mas fiquei imaginando os movimentos do esófago assistindo a outra novela. Compulsivamente fui parar na frente do computador.

Melhor do que não fazer nada é relatar a experiência de ouvir especialistas falando que a gente deve ter um tempo vago. Só nosso. Tempo que permita uma reavaliação da vida... ou simplesmente um tempo, deitado numa rede, em que a gente possa ouvir os pássaros cantando, o vento batendo nas folhas das árvores, o coaxar dos sapos, ou ver uma Lua cheia em um horizonte livre de espigões... hmmm. Sonhar é sempre bom também.

Foi gratificante também ouvir a filósofa Viviane Mosé falar de limite como um elemento da vida social que daria sentido à liberdade. A partir de suas indagações lembrei do Homem Revoltado de Albert Camus,  aquele que nos permitiu compreender que a liberdade absoluta não existe, levando-nos, frequentemente, ao autoritarismo político quando buscada persistentemente. Para a filósofa, os limites forçam a criação de uma potência que faz com que o ser humano fique mais forte: assim fez uma analogia com a hidrelétrica que barra a água prá transformá-la em energia.

Ainda para ela os limites, juntos com as indeterminações, que permeiam as nossas vidas, em todas as relações vividas por nós, são o que há de mais importante para dar vazão a criatividade. Essa criatividade é o deferencial entre os seres culturais (nós, humanos), e os animais, que ainda vivem na natureza, com suas vidas determinadas.

Foi nesse sentido que ela fez a pergunta: Você deseja ser uma Vaca Feliz, ou um Ser Humano Insatisfeito ? Ela mesma responde que devemos escolher a segunda opção. Pois é com essa insatisfação que descobriremos os limites, e a partir daí compreenderemos se desejamos ou não ultrapassá-los.

Mas lembremos que estes não devem ser limites impostos. Devem ser limites acordados. Não sei se ela chegou a falar nesse sentido, mas não vejo uma lógica em acreditar que devemos compartilhar “alegremente” com outros indivíduos que querem nos impor limites não discutidos, não debatidos. Vivemos numa sociedade heterogestionária, portanto temos de aceitar, em algum momento, alguns desses limites não acordados. Mas não sorrindo descaradamente para eles.

Espero que a Petrobras democratize as apresentações desses dois dias de Fórum. E não só com os seus empregados, mas com toda a sociedade. Afinal, a sociedade merece saber o que se passa nesse tipo de encontro de ideias (e além do mais a empresa é pública). Assim, as palavras e os olhares, ali expostos, podem, como disse Viviane Mosé, encontrar ouvidos e outros olhares ávidos de conhecimento, para mastigá-lo e degustá-lo, da forma que lhes convier.

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